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  1. O feminismo é para toda a gente

    segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

    Está-se a tentar recuperar o tempo perdido. Os anos, as décadas, em que o assédio e o abuso sexual de mulheres foram relegados para segundo plano, aligeirados, ignorados. “Erguemos vidas inteiras, famílias e comunidades em torno do buraco deixado pela ausência desta conversa”, sintetizou recentemente a escritora, jornalista e activista feminista inglesa Laurie Penny. Agora a discussão está em cima da mesa. Em Outubro, o novelo começou a desenrolar-se a toda a velocidade em Hollywood com o caso do produtor de cinema Harvey Weinstein. Seguiram-se denúncias em catadupa no mundo da televisão e do cinema, na música, nas artes visuais, no Parlamento Europeu, na política. Os meios de comunicação começaram a olhar com mais atenção para a realidade dos seus próprios países.

    Contudo, a discussão dominante continua a ser demasiado homogénea. Está centrada, sobretudo, nas experiências de mulheres brancas, que correspondem a certos padrões de beleza hegemónicos, que são de classe média-alta e cisgénero (quando a identidade de género de uma pessoa coincide com o sexo e género que lhe foram atribuídos à nascença). Não é, obviamente, uma questão de desvalorizar ou secundarizar a violência de que são alvo, mas sim de ir além de uma visão parcial sobre uma realidade com várias nuances. “Muitas vezes estas questões do assédio e do abuso sexual são vistas de forma linear, com homens-tipo e mulheres-tipo. Existe muita variabilidade dentro do assédio”, afirma Conceição Nogueira, docente da Faculdade de Psicologia da Universidade do Porto e doutorada em Psicologia Social, na área dos Estudos de Género. “Trata-se de dinâmicas sociais de género e de poder complexas. Isto perpassa todas as classes sociais, todas as profissões, todos os corpos, todas as idades. Existe aqui um mundo.”

    Um mundo onde a hierarquia social que determina quem se deve ouvir e em quem se deve acreditar vai também além do género. “Temos de pensar nisto de uma forma muito mais interseccional, senão a discussão avança pouco e quase não saímos da caricatura”, declara João Manuel de Oliveira, investigador em Estudos de Género no ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa e professor visitante na Universidade Federal de Santa Catarina, no Brasil. Reflectir sobre a violência de género a partir de uma “perspectiva binária” é “muito útil para perceber como determinadas sociedades acabam por recorrer a esse sistema para impor as suas normas, para reproduzir determinadas relações sociais”. Mas o mundo não vive assim — Portugal incluído. “Estas categorias sociais de género são intersectadas por outras, como a raça, a classe, a nacionalidade, a religião. Isso tudo influencia”, esclarece o investigador.

    O assédio — na rua, nos espaços públicos, no trabalho, na Internet — é simultaneamente um sintoma e um pilar estrutural das sociedades machistas, racistas, transfóbicas e androcêntricas em que vivemos. É uma cultura sistémica e profundamente enraizada; não é algo característico ou exclusivo de determinados contextos mediáticos e mediatizados como Hollywood. Para minorar e erradicar o assédio e o abuso sexual é preciso começar por desconstruir todo um sistema de opressões intercruzadas que os sustentam e perpetuam. “O assédio tem raízes muito densas. Se pensares de onde é que ele vem, as entidades que são submetidas a isso, como é feito, em que moldes, quais são as consequências. É muito complexo”, reflecte Odete C. Ferreira, DJ e performer de 22 anos para quem o assédio é “uma parte muito grande” e “muito horrível” da sua vida.

    "Há uma narrativa, mesmo nos manuais escolares, que apresenta o nosso corpo ao mesmo tempo como uma propriedade e como algo exótico e hipersexualizado.” Ana Fernandes, activista


    Fonte: Público |||| Ler todo o artigo aqui

  2. Sexualidade é afeto, é partilha, é contacto, é intimidade e faz parte da vida de todos nós, influenciando a nossa saúde física e mental. Quando falamos de sexualidade, falamos também de muitos mitos e crenças a ela associados. Hoje, 3 de Dezembro, Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, vamos falar em sexualidade na deficiência intelectual.

    Numa sociedade em que desde muito cedo se questiona às crianças se já têm namorado, que sentido faz a determinada altura do desenvolvimento deixar de se falar sobre isso na expectativa de que não aconteça ou aconteça mais tardiamente? Agora, imaginem uma criança com deficiência intelectual?! Quando falamos de sexualidade na deficiência, deparamo-nos com muitas inquietações: desde o medo dos familiares de que o seu filho(a), que vêm como criança em corpo de homem ou mulher, sofra com uma experiência para a qual não está preparado(a) – envolvimento sexual, inadequação, abuso, gravidez, exposição pública – à carência de informação sobre as características gerais e sexuais de cada uma das deficiências e preconceitos e crenças erradas que conduzem à privação de educação sexual a estes jovens.
    As famílias dos jovens com deficiência tendem a acreditar que os mesmos são “assexuados” e ficam, por vezes, aterrorizadas com as suas manifestações sexuais. A verdade é que a sexualidade na deficiência intelectual tem contornos próprios.
    As dificuldades específicas da pessoa com deficiência intelectual ao nível do desenvolvimento da maturidade emocional e social, da auto-regulação, da interacção social e das competências na resolução de problemas não lhe permitem por vezes ler e compreender pensamentos e emoções dos outros e até expressar os seus sentimentos adequadamente.
    Por norma, nas pessoas com deficiência existe um défice nos mecanismos de autocrítica, que leva a agir de forma impulsiva – “directa ao assunto” e pouco consciente dos limites. Por outro lado, os seus conhecimentos nessa matéria são insuficientes, até porque, muito provavelmente, terão sido privadas de acesso a educação sexual.
    Da mesma forma que ensinamos sobre as regras e comportamentos correctos a ter em sociedade, é de extrema importância treinar sobre os comportamentos sexuais e a sua adequação social. Essa tarefa cabe aos pais, professores de ensino especial e a todos nós que temos o privilégio de nos cruzarmos com algumas destas pessoas.
    As pessoas com deficiência intelectual estão muitas vezes isoladas no seu meio familiar ou institucional, ficando desta forma privadas de um contexto social normativo que lhes permita adquirirem um bom desenvolvimento psico-sexual. É importante também ressalvar que as pessoas com deficiência intelectual raramente têm os seus momentos de privacidade onde possam ter comportamentos sexuais de auto-erotismo ou com outras pessoas, apesar de lhes ser dito que existem espaços e momentos específicos para isso.

    Como qualquer outro adolescente a passar pela puberdade, os jovens com deficiência devem ter acesso a educação sexual, com metodologia adequada ao grau/severidade da deficiência. Esta deve ser um espaço para:
    * Partilhar conhecimentos, sentimentos e vivências;
    * Favorecer uma atitude informada com especial atenção para alguns riscos de abuso e riscos do meio digital;
    * Trabalhar as competências da comunicação de sentimentos e necessidades sexuais, bem como assertividade para reagir a comportamentos não desejados;
    * Promover atitudes positivas, em vez de atitudes repressivas e discriminatórias face aos seus sentimentos e comportamentos sexuais.

    Respeitando a cultura e a sensibilidade particular de cada um, com as famílias da pessoa com deficiência será necessário:
    * Trabalhar as preocupações e medos dos pais quanto ao futuro sexual dos filhos;
    * Sensibilizar os pais para serem um modelo de conduta que transmite valores e conhecimentos sobre sexualidade;
    * Auxiliar na compreensão da sexualidade como parte integrante do direito à saúde física, mental e sexual.

    Para além de tudo isto, é importante pôr os médicos a abordarem proactivamente as questões relacionadas com a vida sexual, muito em particular noções elementares de sexo e métodos contraceptivos, envolvendo nesta discussão não apenas a pessoa com deficiências mas também, naturalmente, os seus familiares.
    É fundamental que familiares e prestadores de cuidados tenham sempre presente que a aparente ausência de preocupação com a sexualidade não significa de modo algum que tudo esteja bem ou que não haja necessidade de pensar sobre isso.

    Fonte: Público Online