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  1. "Espelho Eu"

    quarta-feira, 22 de junho de 2016

    O projeto Espelho Eu é resultado de uma parceria entre o Instituto de Apoio à Criança (IAC), a Associação de Mães e Pais pela Liberdade de Orientação Sexual e Identidade de Género (AMPLOS) e a empresa BENEXT.

    Para já é uma página de facebook - “Espelho Eu”, mas pretende ser uma plataforma de informação e partilha sobre diversidade de expressões e de identidade de género na infância. Está na calha um site e há conferências, workshops e ações de formação pensadas sobre o tema.
    Transcrevo alguns excertos de noticia do Observador sobre este projeto:

    “Há uns anos fui professora de uma turma fantástica de 1º ano. Alunos com 5 e 6 anos. Havia um menino que não gostava de ir jogar à bola com os colegas. O que ele gostava mesmo era de ficar com as raparigas a fazer desfiles de moda. Quando fazíamos teatrinhos, perguntava-me sempre: ‘Professora, posso escolher a minha personagem? Quero fazer qualquer uma desde que seja uma menina!'”
    A vontade de Vasco (nome fictício) ilustra uma expressão de género diferente da esperada, com base no género atribuído à nascença. Neste caso, Vasco nasceu rapaz porque assim indicou o seu órgão genital. Mas, aos 6 anos, Vasco baralhou o que era expectável e gosta mesmo é de coisas ditas femininas.
    (...)
    Conheci um pai que proibiu o filho de brincar com bonecas, então o menino andava sempre com desenhos de bonecas com ele. Outros só deixam os filhos estar 10 minutos a brincar com as bonecas, negoceiam o tempo, como se fosse algo nocivo. Tipo quando os pais só deixam os filhos estar 10 minutos no iPad”, aponta Margarida.
    O menino mais novo que apareceu na AMPLOS tinha 4 anos. O mais velho tinha 10 anos. Aqui há (mesmo) diferenças entre eles e elas. Elas “são mais livres de brincar como querem”, nota Margarida, e não alarmam tanto as famílias. Já quando eles fogem dos estereótipos masculinos, o despertador soa mais alto. “A família não acha muita piada a um menino que goste de usar brilhantes, ou rosa choque, ou que adore a Chica Vampiro. Há quem evite alguns almoços e jantares para não expor os filhos, porque os amigos da família fazem comentários. Ou então ralham com os filhos e ordenam: ‘Não vais sair de casa assim’. O estigma é muito grande”, sublinha a professora Marta, uma das responsáveis do IAC por este projeto.
    Há muitos estereótipos nas salas de infantário. Há o cantinho das bonecas, o canto dos carrinhos, o canto da cozinha e do ferro de engomar. Sem querer, estes espaços condicionam a expressão de género”, diz Margarida Faria.
    O conflito interior da criança pode desencadear um conflito nas famílias. “Temos pais que se estão a separar e que têm posições diferentes nestas questões. São famílias que discordam na maneira de tratar o assunto”, esclarece Margarida Faria. Há sobretudo alguma dificuldade em falar sobre o assunto, porque temem os rótulos,“temem que o filho venha a ser homossexual ou transexual”, acrescenta a professora.
    (...)
    Ser ‘maria-rapaz’ acaba por não fazer mal, até é engraçado, mas ser ‘mariquinhas’ já é diferente”, sublinha Marta Rosa.
    O nome, esse, é um trocadilho com a expressão do pedaço de vidro que nos mostra quem somos. É fruto de uma ação pro-bono da BeNext, que também desenhou o logótipo. “O nome é uma evolução de ‘Espelho Meu’. É um reflexo mais profundo do que se é além do que se vê à primeira vista. A relação com o espelho pode parecer óbvia mas, no caso destas crianças, é o momento em que se confrontam com a ‘sua’ imagem que pode não corresponder àquilo que elas ‘são’ no seu íntimo“, explica Raul Reis, diretor criativo da agência de publicidade e design.
    A imagem do projeto reflete precisamente essa fusão entre feminino e masculino. “Representa essas dúvidas que chegam da intimidade. O círculo representa o mundo fechado em que estas crianças vivem, porque têm duvidas sobre a aceitação. Os dois rostos dão esta dupla função de causar essa ambiguidade. Esta figura que se vê ao espelho vê na realidade outra figura”, remata o criativo.
    Esta é também uma questão de cores. Tanto o IAC como a AMPLOS clamam pelo fim dos “bibes cor de rosa e azul” e da “chuva de roupas rosa ou azul que rebenta quando a grávida diz de que sexo é o bebé”. Em vez disso, sugerem que seja dada liberdade pelos pais e educadores para que as crianças escolham as brincadeiras, os desportos e as roupas que quiserem. O próprio logótipo não foi colorido ao acaso.“Quisemos escolher cores mais ambíguas que também refletissem a dúvida, e fugir ao óbvio rosa e azul”, explica Raul.
    Segundo a presidente da AMPLOS, um dos objetivos principais é dizer a crianças e famílias “que não estão sozinhas” e passar a mensagem, através de testemunhos e artigos, de que “é essencial que as crianças cresçam em ambientes seguros, livres, venham a ser o que forem. A fluidez de género é só isso — fluidez de género. O futuro não se sabe”, sublinha.
    A página é gerida em conjunto pelas duas organizações e por pais de crianças com fluidez de género. Os professores e médicos são alvos preferenciais: “Nós no IAC sabemos que há professores que não sabem lidar com uma expressão de género diferente na sala de aula ou no recreio. Há crianças que são encaminhadas para o psiquiatra.As atitudes que se tomam nesta idade podem ter consequências terríveis”, adverte.
    Vasco queria ser uma menina nas peças de teatro da escola e o pedido não foi problemático. Nem para a professora Marta Rosa nem para as restantes crianças. “Ele assumia a personagem de menina em tudo: na voz, nos gestos, no andar. Os outros miúdos achavam imensa piada. Mas isto nem sempre acontece assim”, conclui a professora.

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